Bernardette
Fernandes possui 29.948 metros quadrados de terreno nas Sete Fontes, o que lhe
confere o estatuto de terceira maior proprietária de terrenos no espaço onde a
Câmara Municipal de Braga pretende criar o Parque das Sete Fontes.
Proprietária
desde 2014, por herança dos pais, Bernardette Fernandes já perdeu um negócio de
um milhão de euros com a Santa Cada da Misericórdia de Vila Real, que lhe quis
comprar 4 mil metros de terreno, pelos quais ofereceu 250 euros por metro
quadrado. Agora, sente-se injustiçada pela Câmara Municipal de Braga, que só
quer pagar 10 euros.
“A Câmara
pretende fazer um brilharete à custa dos proprietários dos terrenos localizados
nas Sete Fontes”, considera Bernardette Fernandes, que já apresentou em
tribunal um pedido de indemnização superior a 2 milhões de euros. “Estou
disposta a defender os meus direitos até às últimas consequências”, garante a
proprietária.
Bernardette Fernandes junto ao terreno de que é proprietária |
PERGUNTA (P.) – Há quanto tempo é que
é proprietária de terreno nas Sete Fontes? Como se tornou proprietária?
BERNARDETTE
FERNANDES – Sou dona e legítima proprietária do prédio denominado Quinta de
Chedas, no lugar de Chedas, freguesia de São Vítor, concelho de Braga, desde 29
de Outubro de 2014, data em que adquiri a propriedade em causa por via da
doação que os meus pais me fizeram. Os meus pais foram os anteriores
proprietários dos terrenos, pelo menos, desde1985. Trata-se, portanto de uma
propriedade que esteve desde sempre na posse da minha família e, como tal, além
do seu valor patrimonial, existe o valor sentimental que é incalculável.
P. – Qual é a área da sua
propriedade?
BERNARDETTE
FERNANDES – A minha propriedade possui a área total de 29.948 metros quadrados.
Curiosamente, é o único terreno que não é ocupado por nenhuma das construções
antigas do monumento das Sete Fontes, nem possui nenhuma linha de água.
“ALGUÉM SE LEMBROU DE ALTERAR AS
REGRAS DO JOGO”
P. – Agora, a Câmara Municipal de
Braga pretende o seu terreno para criar o Parque Urbano das Sete Fontes e
oferece-lhe 10 euros por metro quadrado. É um valor justo?
BERNARDETTE
FERNANDES – Não é justo, longe disso. Não sou promotora imobiliária, sou apenas
uma cidadã, que tem a sua propriedade, mas que não pode ser prejudicada. Tenho
os meus direitos, aliás, consagrados nos instrumentos de gestão do território,
que agora pretendem ignorar. De acordo com o Plano Diretor Municipal de Braga revisto
e aprovado em 2001, e em vigor até 14 de Outubro de 2015, toda a extensão do
meu terreno foi classificado como espaço urbanizável. O que significava que o
prédio em causa possuía viabilidade construtiva, sendo que o coeficiente de
construção para o local em causa de 1/1, ou seja, de cem por cento. Com a
revisão do Plano Diretor Municipal ocorrida em 14 de Outubro de 2015, o terreno
em causa foi enquadrado na chamada “Unidade Operativa de Planeamento e Gestão
(UOPG) 9 – Parque das Sete Fontes”, tendo, no âmbito dessa revisão do PDM,
sofrido uma alteração da classificação do solo, passando da classificação de
“Espaços Urbanizáveis”, na sua totalidade, para “Espaços Residenciais” e “Espaços
Verdes de Utilização Coletiva”.
P. – Dos quase 30 mil metros
quadrados, quais as áreas agora classificadas como “espaços residenciais” e
como “espaços verdes de utilização coletiva”?
BERNARDETTE
FERNANDES – Estamos a falar de 6,600 metros quadrados de espaços residenciais e
de 23.200 metros quadrados destinados a espaços verdes de utilização coletiva.
Portanto, de acordo com o atual PDM, o terreno passou a ter suas classificações
distintas, sendo a parte maior destinada ao parque, o que prejudica seriamente
os direitos e as expectativas da nossa família relativamente ao valor da propriedade.
Estamos a falar de uma propriedade que tinha um valor e que, de um momento para
o outro, deixou de ter, só porque alguém se lembrou de alterar as regras do
jogo. Não é justo.
Bernardette Fernandes junto ao terreno de que é proprietária |
“FAZER O PARQUE À CUSTA DOS
PROPRIETÁRIOS É UMA ENORME INJUSTIÇA”
P. – A Câmara Municipal não deve
preservar o monumento das Sete Fontes?
BERNARDETTE
FERNANDES – Não disse isso. Acho muito bem que o monumento das Sete Fontes seja
preservado. É a memória da cidade que está em causa. O que não é justo é que o
monumento seja preservado à custa dos proprietários dos terrenos. Se o
monumento tem um valor histórico, cultural e patrimonial, então o Município –
que somos todos nós, que pagamos o imposto municipal sobre imóveis – deve
comprar os terrenos por um valor justo, um valor que seja um reflexo do grande
valor patrimonial que a comunidade pretende preservar. Fazer isso à custa dos
proprietários é uma enorme injustiça.
P. – Acha que ainda é possível o
diálogo e a negociação?
BERNARDETTE
FERNANDES – Sempre estive disponível para dialogar. Ainda recentemente tivemos
reuniões com a Câmara Municipal, mas não foram dadas garantias de que os nossos
direitos iriam ser cabalmente defendidos.
Recentemente, num jornal sobre as Sete Fontes, vi dois estudos de dois
arquitetos que me pareceram duas excelentes propostas de trabalho, que defendem
os interesses de todos. Espero que o Município de Braga leve essas ideias em
conta.
“MISERICÓRDIA DE VILA REAL OFERECEU
250 EUROS POR M2”
P. – Já teve alguma oportunidade de
negócio que tenha sido impedida por causa deste impasse nas Sete Fontes?
BERNARDETTE
FERNANDES – Em Janeiro de 2016, a Santa Casa da Misericórdia de Vila Real
contactou-me no sentido de me apresentar uma proposta para a compra de uma
parcela de terreno com a área de quatro mil metros quadrados, mostrando
interesse na sua aquisição, pois pretendia construir no local uma residência
sénior, dada a sua proximidade ao atual Hospital de Braga. Pela aquisição dessa
parcela de terreno, com a área de 4.000 metros quadrados, a Santa Casa de
Misericórdia de Vila Real propôs o valor de 250 euros por metros quadrado, o
que totalizaria um milhão de euros.
P. – Por que é que o negócio não
avançou?
BERNARDETTE
FERNANDES – A Santa Casa da Misericórdia de Vila Real condicionou a
concretização do negócio à apresentação de um Pedido de Informação Prévia
(PIP), dado o facto da referida parcela de terreno se encontrar inserida atualmente
na “UOPG 9 – Parque das Sete Fontes”. Em Maio de 2016, tentei proceder à
apresentação junto dos serviços da Câmara do Pedido de Informação Prévia, mas
fui impedida de concretizar essa pretensão com o fundamento de que estava em
discussão a aprovação do Plano de Pormenor para o Parque das Sete Fontes. Acabei
por não conseguir concretizar o negócio com a Santa Casa de Misericórdia de
Vila Real que viria a direcionar o seu projeto para a cidade de Vila Nova de
Gaia. E assim perdi um milhão de euros.
P. – Uma verba de 250 euros por metro
quadrado é bem mais do que os 10 euros oferecidos pela Câmara Municipal.
BERNARDETTE
FERNANDES – A Câmara Municipal de Braga apresentou-me uma proposta, assim como
aos restantes proprietários com terrenos nas Sete Fontes, a qual é pública e do
conhecimento geral, no sentido de me convencer a aceitar a “expropriação” do
meu prédio pelo mísero valor de 10€/m2, advertindo-me de que se não aceitasse
essa proposta, certamente veria o índice construtivo previsto para o meu terreno
ser substancialmente reduzido com a aprovação do Plano de Pormenor previsto
para as Sete Fontes. Isso, a concretizar-se, aumentaria o já incalculável
prejuízo sofrido por mim com toda esta situação. É óbvio que essa proposta não
será aceite por mim. Estou disposta a defender e reivindicar os meus direitos
até às últimas consequências.
Bernardette Fernandes junto ao terreno de que é proprietária |
“CÂMARA PRETENDE FAZER UM BRILHARETE”
P. – Considera que, ao oferecer 10
euros por metro quadrado de terreno, a Câmara de Braga quer confiscar terrenos
privados para fazer um parque à custa dos proprietários?
BERNARDETTE
FERNANDES – A Câmara Municipal não pode pretender obter os seus intentos à
custa do desrespeito pelos meus direitos, enquanto proprietária. Tenho um terreno
nas Sete Fontes, pretendem usufruir do mesmo através da minha “expropriação”, o
mínimo que será exigido é que me paguem o valor justo por essa “expropriação” e
o valor de 10€/m2 não é de todo o valor justo.
P. – Tanto quanto sabemos, na mesma
zona, quando foi construído o hospital, o Governo pagou muito mais pelas
expropriações.
BERNARDETTE
FERNANDES – É verdade. No ano de 2011 foi pago o valor de 70€/m2 pela
expropriação de terrenos, localizados na mesma área, com a finalidade de
construir o Hospital de Braga. A disparidade de valores, só por si, revela a
injustiça do valor agora proposto pela Câmara.
P. – Em sua opinião, por que é que a
Câmara Municipal oferece tão pouco pelos terrenos das Sete Fontes?
BERNARDETTE
FERNANDES – Infelizmente, a Câmara, de forma pouco séria, pretende fazer um
“brilharete” à custa dos proprietários dos terrenos localizados nas Sete
Fontes. Para fazer o estádio municipal, as piscinas que se encontram junto ao
estádio e as obras de beneficiação dos Campos da Rodovia, a Câmara Municipal
gastou muitos milhões de euros, alguns, como é do conhecimento público, de
forma totalmente irresponsável. Só por isso é que se justifica a forma aflitiva
com que a Câmara se pretende desfazer do Estádio Municipal e a total ausência
de soluções para as obras que se destinavam à conclusão das piscinas. Para
estas obras, de forma despesista, gastaram-se milhões de euros e agora para a
criação do Parque que pretende criar nas Sete Fontes, a Câmara pretende fazê-lo
à custa dos proprietários dos terrenos. Os intentos da Câmara não são sérios e
a pergunta que me ocorre fazer ao senhor Presidente da Câmara é a seguinte: se
ele fosse um dos proprietários de terreno nas Sete Fontes aceitaria a forma
como a Câmara se pretende apropriar desses terrenos?
Bernardette Fernandes |
O RECURSO AO TRIBUNAL
P. – O Parque das Sete Fontes foi uma
grande promessa eleitoral do atual presidente da Câmara, quando era vereador e
candidato da oposição. Passaram 6 anos e ainda não sabemos quando haverá
parque.
BERNARDETTE
FERNANDES – A Câmara não tem o direito de querer cumprir as suas promessas
eleitorais à custa dos proprietários dos terrenos das Sete Fontes. O que
pretendo é que haja uma solução que satisfaça os interesses da Câmara, dos
cidadãos da cidade de Braga e dos proprietários e, salvo o devido respeito, a
solução até é fácil de se encontrar.
P. – Que solução preconiza?
BERNARDETTE
FERNANDES – A Câmara infraestrutura o
terreno, na parte em que possua viabilidade construtiva, dando a cada
proprietário um índice de construção nunca inferior a 0,42 % relativamente à
área de terreno que possui, isentando os proprietários das taxas para
construção. Desta forma, a Câmara despenderia pouco dinheiro a elaborar o projeto
global para as Sete Fontes e a realizar as infraestruturas nos terrenos com
viabilidade construtiva; os cidadãos iriam poder usufruir do Parque das Sete
Fontes; e os proprietários poderiam construir ou comercializar os terrenos de forma
minimamente satisfatória. No meu entendimento, se junto ao Parque não existir
habitações, o mesmo não terá “vida” e rapidamente irá tornar-se um sítio
perigoso para as pessoas da cidade se deslocarem e dele usufruírem.
P. – Recentemente, apresentou uma
ação em tribunal na qual pede uma indemnização da Câmara Municipal de Braga
superior a 2 milhões de euros. Porquê?
BERNARDETTE
FERNANDES – Para apuramento dos danos/prejuízos que sofri recorri a uma
avaliação do terreno, tendo por base o método residual estático e para o efeito
tivemos em consideração a diferença entre o valor de mercado atual e o valor de
mercado em 2015 e nas diferentes condições/índices construtivos previstos nos
planos diretores municipais de 2001 e 2015. Segundo a avaliação realizada, em 2015,
o valor de mercado da minha parcela de terreno era superior a três milhões de
euros, sendo que, atualmente, o valor do terreno em causa ronda os 980 mil
euros. Estes números foram calculados tendo em conta as capacidades
construtivas previstas no PDM em 2001 e 2015 e respetivo valor de mercado. A
desvalorização foi, assim, estimada em dois milhões e 28 mil euros, que é o
valor da indemnização pedida em tribunal.
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